domingo, fevereiro 20, 2011

E o que é que eu sei?

E se eu tivesse feito as coisas outra forma?

E se eu tivesse tido um pai de verdade?

E se eu tivesse ficado no Brasil?

E se eu tivesse dito algo mais?

E se eu tivesse sabido o que dizer?

E se as coisas, todas as coisas, tivessem sido diferentes? A verdade é que as coisas são o que são. Eu fiz o que fiz, meu pai nunca foi mesmo um pai, eu vom morar nos EUA, nunca disse mais do que tinha que dizer, e nunca soube o que dizer para o homem que deveria ser tão importante em minha vida, mas nunca fez parte dela de verdade.

E-se? E-se não é a vida. A vida é o que é. E a vida segue em frente, sempre em frente, nunca parando para quem precisa ou quer dar um tempo. Como diz a canção, "sem pedir licença, muda nossas vidas e depois convida a rir ou chorar."

Então, como é ordenado a todos os vivos, a morte veio para o homem que foi meu pai. E, por mais que nunca tenha havido uma real relação de pai e filha entre nós, eu fiquei para trás para catar os cacos daquilo que poderia ter sido, e chorar a perda daquilo que eu nunca tive de verdade.


É difícil descerver meus sentimentos agora. Desde que soube da notícia, tem sido difícil descrever qualquer coisa.

Estou triste. Tristeza talvez seja o sentimento mais fácil de descrever. Porque é tão genérico. Pois muitas vezes me encontro chorando e não sei explicar porquê.

Por que me sinto triste e choro a perda do que nunca tive?

Me sinto triste e choro porque, como um ser humano que sou, estimo memórias e relacionamentos, sejam escassas as memórias e errados os relacionamentos.

Me sinto triste e choro porque perdi meu pai. Um pai com quem compartilheir memórias e tive um relacionamento, escassas tenham sido as memórias e errado o relacionamento.

Me sinto triste e choro porque estou lidando, de forma muito próxima, com a Morte.

Morte. Por que é a Morte a única coisa certa em nossas vidas, e ainda assim, nós, seres humanos, temos tanta dificuldade em lidar com ela? Como um ser humano que sou, eu não lido muito bem com a noção de perda. Nós sempre queremos mais tempo. Mais tempo para consertar o que não foi consertado a tempo. Mais tempo para aproveitar o que não foi aproveitado a tempo. Mais tempo para dizer o que não foi dito a tempo. Nós sempre sabemos, ou achamos que sabemos, que algo mais poderia ter sido feito. Não é verdade? Nós esperamos por situações ideais num mundo onde nada é ideal.

Morte. Por que nos aborrece ver-nos frente a frente com ela? Porque, como ser humano que somos, quando nos vemos a encará-la, temos que reconhecer que ela virá para todos nós, tenho que reconhecer que virá para mim. Quando ecaramos a Morte temos que reconhecer nossa própria finitude. Percemos então que somos meros seres finitos. E, enquanto pela vida, enterramos aqueles que deixam de viver ao passo que nós continuamos, virá o dia, um dia bem próximo, no qual outros nos enterrarão, e eles continuarão. Seguirão ao encontro do seu próprio fim um dia, num futuro que nós não estaremos lá para ver. E a Vida continua. E a Morte continua vindo para todos os vivos.

De repente eu percebo que a vida é tão curta! Hoje aqui, amanhã em lugar algum. Aqueles dentre nós que tem sorte viverão além dos 70 ou 80. Aqueles que tem muita sorte, passarão dos 90. Uns poucos seletos chegarão a um século de vida. Mas fala sério! Que são 100 anos de vida? Nada!!!

Há tanto para se fazer e tão pouco tempo! Há tanto deixado sem fazer. Deixado para depois. Meu pai morreu sem ver o dinheiro da indenização que seu trabalho lhe devia há mais de 20 anos! Dinheiro que espero que chegue para nós um dia, é verdade, mas não muda o fato de que ele morreu esperando por ele. Para ele isso não mais importa. Algumas pessoas falam dos mortos como se eles soubessem das coisas. Eles estão felizes por nós, onde quer que estejam. Eles estão vingados, eles estão isso ou aquilo! Os mortos não sabem de nada! Não é o que diz a Bíblia?Aquele dinheiro, meu pai nunca o verá! Pode vir para nós, seus filhos. Pode até ser que nos faça algum bem, quando e se vier. Mas meu pai morreu na espera. E sem nunca poder saber o que foi feito...

Então por que outro motivo encarar a morte nos aborrece? Por causa do que foi deixado sem fazer, sem receber, sem dizer. Talvez nosso medo não seja da morte em si, mas da vida não-vivida. Uma vida vivida eternamente em espera. Espera pela hora certa, uma hora certa que nunca chegou. Uma vida em espera.

Há vários ditados sobre uma vida não-vivida: "A gente só se arrepende do que não faz", "Você terá tempo para dormir depois de morto", "Quem muito dorme pouco vive". Não posso evitar, quando penso nessas coisas, perguntar a mim mesma: Que estou esperando? Por que espero para dizer coisas, fazer coisas, mostrar amor por outros? Por que espero para fazer o que devo? Por que espero para me divertir, par air a lugares especiais, para comer comidas especiais? Por que coloco minha vida em espera quando sequer sei quanto mais tempo eu tenho com essa vida? Por que todos nós fazemos isso?

A Morte sempre será triste. Acho que seria melhor se nunca chegasse. Sério, quem gosta de se despedir? Eu sei que eu não gosto. E olha que eu faço isso com frequência. Nunca é divertido. Entretanto, se percebessemos que despedir-se da vida é inevitável, será que viveríamos vidas mais plenas? Não sei.

Não me meto a saber a resposta final para nenhuma das questões aqui mencionadas. Sou apenas uma garota lidando com a morte de forma muito real e tentando entender alguma coisa. Tentando lidar com os sentimentos que não entendo completamente E tudo que sei é que não sei quanto tempo de vida me resta a mim ou àqueles que me são queridos. Tudo que sei é que quero aproveitar o melhor do tempo que tenho ainda. Isso é tudo que sei. Será que esse conhecimento será suficiente quanto a morte cruzar novamente meu caminho? Nem isso eu sei com certeza.

Um comentário:

Anônimo disse...

Essa pergunta "que estou esperando?" tem me corroido ultimamente e seriamente falando... estou casanda de esperar, ficar no ar... Como vc diz, a vida é curta e quero viver. ;-)
Lua